Meu tio matou um cara
Falar bem de cinema nacional é até chato. Sempre que um filme se sai bem lá vem toda a mídia dizendo o quanto a indústria no Brasil produz ótimas obras, que alguns não devem nada pra os enlatandos americanos (muito pelo contrário, os superam) e coisas do tipo. Bem, aqui vem a minha rasgação de seda para Jorge Furtado, cineasta gaúcho que desde "Ilha das flores" (1989), um documentário que você provavelmente viu mas não se lembra, me atrai. Tudo bem que de seus filmes eu só conheço "O homem que copiava", mas considerando que a produção de longas de um mesmo diretor no Brasil não é muito extensa, ele já me fez um fã. Eu quem sabe um dia um de ator de seus filmes.
"Meu tio matou um cara" conta como Duca (Darlan Cunha), adolescente de 15 anos, investiga um crime cometido por seu tio Éder (Lázaro Ramos), réu confesso, que chega na casa dos pais do garoto pedindo ajuda. Estes tentam amenizar a notícia a Duca, mas, expert em jogos de investigação, ele é quem analisa com maior tato o caso. Enquanto tenta descobrir como ocorreu o crime do tio ele ainda tem que lidar com a paixão por Iza (Sophia Reis), e a paixão desta por seu melhor amigo, Kid (Renan Gioelli).
Trama feita, o mais importante é como Furtado a conduz. Misturando tudo em uma tragédia cômica, com cenas muito bem vindas de "comédia gratuita", é sob a ótica de Duca que o filme é levado. Ótica essa o maior mérito do diretor (que assina o roteiro com Guel Arraes), já que consegue mostrar o adolescente sem um olhar paternalista ou idiota como muito se vê na mídia. Duca é um jovem negro, que vive em Porto Alegre e tem uma vida que poderia ser a de qualquer garoto em qualquer lugar do mundo.
Somando a essa condução, os atores estão ótimos. Lázaro Ramos mais uma vez mostrando que tudo o que tem tocado vira ouro (pra mim, o melhor ator brasileiro) nos dá uma brilhante interpretação, cheia de trejeitos e com seu olhar de cachorro perdido impagável. Darlan Cunha também segura a onda muito bem assim como o elenco jovem. Dira Paes e Ailton Graça fazem muito bem seus papéis de pais preocupados, com destaque a atriz, exelente. Bem, Deborah Secco está lá e não faz nada demais.
Como um todo, o filme trata da velocidade de informação. E de pensamento. Enquanto os adultos mantém seu comportamento conservador, é nos jovens que eles julgam inocência que esse comportamento é altamente mutável e de fácil adaptação. Isso fica claro na diferença entre a procupação dos pais com o crime do tio e o raciocíno rápido de Duca, que, ao saber do ocorrido, já pergunta: "recolheu a arma, pegou o carro, não mexeu an cena do crime?"
Destaque também pra ótima salada da trilha sonora, que passa por Caetano, Nando Reis, Happin Hood, Orquestra Imperial e Pitty. Estou baixando o CD. Ah e falando em CD, ótima a cena na qual entre escolher um disco original ou 4 piratas, Duca opta pela opção óbvia de todo brasileiro. Não que sejamos ladrões dos direitos autorais e eu ache isso lindo, mas que é a opção, é.
Agora estou com muita vontade de ver "Saneamento Básico" que estreou na semana passada. Vá você lá também e, "ufanismo a parte", veja o quanto nossa indústria está crescendo em qualidade...